domingo, 26 de abril de 2009

Sistemismo Ecológico Cibernético - Livro de autoria de Edson Paim e Rosalda Paim

Este livro trata de um paradigma de natureza abrangente, integrativa, holística - o Sistemismo Ecológico Cibernético - que corresponde ao Sistemismo ampliado, construído com alicerce em quatro pilares principais: Teoria Geral dos Sistemas, Cibernética, Teoria da Informação e Ecologia, constituindo-se, assim, uma metodologia de caráter multirreferencial.


O primeiro capítulo apresenta uma introdução ao método científico, enquanto o segundo trata do enfoque sistêmico ou Sistemismo, um quadro de referência, baseado na Teoria Geral dos Sistemas, de Lwidg von Bertalanffy; o terceiro aborda uma perspectiva, com fundamento em um ramo do conhecimento, integrante da Teoria Geral dos Sistemas - a Cibernética - definida como a “ciência das comunicações, do comando e do controle, no homem, na máquina e na sociedade”.


As virtuosidades da Cibernética são ampliadas, mediante a inclusão da Teoria da Informação, no seu bojo.


O quarto capítulo - Vida e Entropia - refere à ação sobre o processo Vida, exercida pela entropia - uma tendência universal para baixo, para o resfriamento, para o nivelamento energético, para a indiferenciação, para a desorganização, para a mesmice, para a catamorfose, para o caos, para a morte.


O quinto, concerne a uma Visão Ecológica, aspecto que não deve ser negligenciado na abordagem de qualquer sistema, seja este de natureza física, biológica, social ou tecnológica, pois todos eles inter-relacionam e interagem com o ambiente (ecossistema), através de continuas trocas de matéria, energia e informações entre ambos, afetando-se mutua e continuamente.


A Cibernética dos Sistemas Vivos é enfocada no sexto capítulo, referindo-se à existência de mecanismos de controle e de reajustes automáticos (“feedback”) nos organismos vivos, o sétimo apresenta a Dialética dos Sistemas Vivos, porta de entrada para o oitavo - Dialética Cibernética, - contendo duas propostas dos autores, baseadas nos conflitos entre os sistemas e o seu ambiente (ecossistema) e nos antagonismos existentes entre a entropia e seu par antagônico (dialético) - a negentropia - além de se fundamentar na oposição entre os processos de oxidação e redução, entre a saúde e a doença e, entre a vida e a morte.


A entropia, como já afirmamos, corresponde a uma tendência universal, inexorável, para o resfriamento, para o nivelamento energético, para a mesmice, para a catamorfose, para a indiferenciação, para o caos, para a própria morte, enquanto que a negentropia (entropia negativa), representa uma contra corrente à lei geral da entropia.


Guillaumaud, em seu livro que se intitula “Cibernética e Materialismo Dialético”, atesta o caráter dialético do mecanismo de retroação ou retroalimentação (“feedback”), um atributo universal dos seres vivos e um dos fundamentos da Cibernética, capaz de reforçar a nossa proposta de uma Dialética dos Sistemas Vivos e, de uma Dialética Cibernética.


O nono capítulo concerne à Entropia e Sistemas Sociais, - a entropia das organizações humanas - isto é, uma tendência no sentido de se desorganizarem, de se extinguirem, mas sobre as quais os operadores desses sistemas podem exercer uma ação no sentido oposto - ação negentrópica - com o fito de evitar sua desestruturação e finitude, objetivando alongar o seu período de existência ou até tentar perenizá-las.


Os nove capítulos referidos, que se pretende inter-relacionados, interligados, entrelaçados, integrados, como uma malha, uma rede, uma teia de idéias, fundamentos, conceitos e princípios, constituem o alicerce do Sistemismo Ecológico Cibernético -
o Sistemismo ampliado - constante do capítulo décimo, um referencial, cujo caráter é abrangente, integrativo, holístico, elaborado segundo um paradigma que se inspira no modelo de organização dos seres vivos e dos ecossistemas naturais, sobretudo, na estrutura sistêmica do genoma humano e, no funcionamento cibernético do nosso cérebro, incluindo os atributos da consciência - correspondente a uma proposta elaborada dos autores, inicialmente, para servir como alicerce ou base filosófica da Teoria Sistêmica Ecológica Cibernética de Enfermagem, elaborada por um de nós (Paim, Rosalda - 1974), cuja ampliação resultou no Sistemismo Ecológico Cibernético, destinado a atender a propósitos mais amplos.


O capítulo seguinte - o décimo primeiro - Sistemismo Ecológico Cibernético e Sistemas Sociais se refere a uma aplicação prática do paradigma sistêmico-ecológico-cibernético, abordando os sistemas sociais abertos, democráticos, cuja essência é a utilização de mecanismos de “feedback”, capazes de permitir o funcionamento equilibrado, harmônico, em toda a sua plenitude.


O capítulo XII trata da utilização do Sistemismo Ecológico na Saúde, na Enfermagem e na Educação, mas aplicável, também, a outros ramos do conhecimento, enquanto que o XIII e último, relata experiências bem sucedidas, realizadas por um dos autores (Rosalda Paim), referentes à idealização, construção, operacionalização, avaliação e reajustes de modelos inovadores, no âmbito do Sistema Municipal de Saúde de Niterói-RJ, cujo relato foi apresentado, pelos autores, na II Conferência Internacional de Saúde Familiar, realizada em Valdívia, Chile, em 1997.


O paradigma sistêmico-ecológico-cibernético proposto é passível de aplicação a todo e qualquer sistema, seja de natureza física, biológica, social ou tecnológica, mercê destes possuírem, como denominador comum, os atributos universais dos sistemas, entre os quais:

1) - os sistemas são conjuntos de partes interligadas e inter-relacionadas, atuando conjuntamente, com objetivo característico;

2) - os sistemas estão inseridos no ambiente;

3) - a totalidade dos sistemas abertos efetua contínuas trocas com o seu ambiente imediato;

4) - Os intercâmbios entre cada sistema e o seu ambiente podem ser sintetizados como trocas permanentes de matéria, energia e informações entre um e outro, afetando-se mutuamente, isto é, sofrendo, em conseqüência, influências recíprocas.


Um determinado sistema, acrescido dos seus arredores, por sua vez, constitui, um outro sistema, de maior amplitude e, de natureza mista: o conjunto sistema-ambiente, que pode ser designado universo - com u minúsculo - para não confundir com Universo, sistema cósmico.


A Teoria Geral dos Sistemas e o Sistemismo Ecológico Cibernético podem ser aplicados tanto ao estudo de um automóvel, de uma empresa ou do próprio ser humano, quanto de um município, de um estado, de um país, ou de qualquer um dos seus subsistemas, incluso o respectivo ambiente - também um sistema - face às características que compartilham, como os aspectos de totalidade, abrangência, integralidade e inter-relacionamento entre suas partes integrantes e, do conjunto intercambiando com o ambiente. O fato de corresponderem a sistemas, sintetiza os atributos comuns a todos eles,


O próprio planeta Terra e, mesmo o Universo inteiro, por constituírem sistemas, podem ser visualizados por este prisma, considerando-se, entretanto, que o Sistema Universal corresponde ao único sistema sem ambiente, pois não se pode conceber a existência de algo em seu redor, constituindo, portanto, um sistema fechado.

sábado, 11 de abril de 2009

Interdisciplinaridade, Multidisciplinaridade e Transdisciplinaridade - Nurimar Maria Falci

Foi-nos solicitada a diferença entre os termos Interdisciplinaridade, Multidisciplinaridade e Transdisciplinaridade, por uma pessoa que não nos enviou seu nome, apenas o endereço e.mail e a cidade, a bela Salvador Bahia.
Recorremos ao livro " A cabeça Bem Feita", de Edgar Morin, pg.115, Bertrand Brasil."
(...) Por exemplo: a interdisciplinaridade pode significar, pura e simplesmente, que diferentes disciplinas são colocadas em volta de uma mesa, como diferentes nações se posicionam na ONU, sem fazerem nada além de afirmar, cada qual, seus próprios direitos nacionais e suas próprias soberanias em relação às invasões do vizinho.
Mas interdisciplinaridade pode significar também troca e cooperação, o que faz com que a interdisciplinaridade possa vir a ser alguma coisa orgânica.
A multidisciplinaridade constitui uma associação de disciplinas, por conta de um projeto ou de um objeto que lhes sejam comuns; projeto ou de um objeto que lhes sejam comuns; as disciplinas ora são convocadas como técnicos especializados para resolver tal ou qual problema; ora, ao contrário, estão em completa interação para conceber esse objeto e esse projeto, como no exemplo da hominização.
No que concerne à transdisciplinaridade, trata-se freqüentemente de esquemas cognitivos que podem atravessar disciplinas, às vezes com tal virulência, que as deixam em transe.
De fato são os complexo de inter-multi-trans-disciplinaridade que realizaram e desempenharam um fecundo papel na história das ciências; é preciso conservar as noções chave que estão implicadas nisso, ou seja, cooperação, melhor, o objeto comum; e melhor ainda, projeto comum."

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Clássico da filosofia analítica demole mito

Conhecer envolve, segundo Wilfrid Sellars, um processo inferencial e uma dimensão social.

José Renato Salatiel

(13/03/2009)

A obra Empirismo e filosofia da mente (Editora Vozes, 2008), de Wilfrid Sellars (1912-1989), é um dos marcos da filosofia analítica, uma das mais influentes escolas na Europa e, principalmente, nos Estados Unidos.

Apesar de curto, o ensaio de Sellars é denso e requer um leitor mais atento e dedicado, além de exigir certo repertório em história da filosofia, uma vez que o autor dialoga com correntes diversas.

A edição brasileira, entretanto, preservou a introdução de Richard Rorty (um dos mais importantes filósofos norte-americanos da atualidade), que contextualiza o trabalho, e os comentários de Robert Brandom, direcionados inicialmente para seus alunos dos cursos de graduação e pós-graduação na Universidade de Pittsburgh (EUA), onde Sellars também lecionou. Ambos os textos podem servir como fio de Ariadne nos labirintos argumentativos do filósofo.

Além disso, a importância de Sellars no pensamento contemporâneo, incluindo a filosofia da mente, é suficiente para recompensar o leitor mais obstinado. Mas qual é a contribuição deste pensador norte-americano para a filosofia? Para responder a questão, passaremos brevemente por alguns princípios básicos da filosofia analítica.

Teoria do conhecimento

Epistemologia é o ramo da filosofia que trata das teorias do conhecimento. Ela procura responder a perguntas como “O que é o conhecimento?”, “Como posso conhecer algo e em que condições?” e “Como posso obter um conhecimento verdadeiro e, ainda, saber se estou de posse de um?”.

Tradicionalmente, duas correntes da filosofia apresentaram soluções diferentes para o problema. Os racionalistas – René Descartes (1596-1650), Gottfried Leibniz (1646-1716) e Baruch de Spinoza (1632-1677), entre outros – desenvolveram sistemas que inseriam a metafísica no caminho seguro da matemática, fornecedora de conhecimento dedutivo e necessário. Enquanto os empiristas, como Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704) e David Hume (1711-1776), viam na experiência, apesar de contingente, a única fonte de saber para o homem.

O filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) superou as duas tendências com seu método transcendental. Pare ele, sem a luz da razão para nos guiar, tateamos cegos pelo mundo dos objetos. Por outro lado, a razão sem a experiência não tem conteúdo e, sem o peso das coisas e o lastro da realidade, sente-se livre para arriscados voos dogmáticos.

Tendo a crítica kantiana às metafísicas tradicionais como ponto de partida, a filosofia analítica emerge no âmbito da chamada “virada linguística” (linguistic turn), que substituiu uma perspectiva do conhecimento baseada na relação entre sujeito e objeto por uma compreensão centrada e amparada na linguagem, seja ela ordinária ou lógico-simbólica.

Deste modo, fez da filosofia, basicamente, uma análise do significado de conceitos, aliando, inicialmente, o transcendentalismo kantiano e o empirismo clássico britânico ao método oriundo da lógica de Gottlob Frege (1848-1925), considerado o “pai” da lógica moderna.

A filosofia analítica se origina pouco antes da Segunda Guerra Mundial, com o positivismo ou empirismo lógico, escola criada em torno do chamado Círculo de Viena, que reunia nomes como Moritz Schlick (1882-1936) e Rudolf Carnap (1891-1970).

Para eles, era essencial a distinção kantiana entre proposições analíticas e sintéticas. O critério de verificação para proposições analíticas é meramente dedutivo, como sentenças aritméticas, por exemplo. Já juízos sintéticos dependem de uma checagem empírica, isto é, de um confronto com a realidade. Proposições do tipo “Deus existe”, portanto, eram destituídas de sentido, porque não se pode provar empiricamente a existência de Deus.

Consequentemente, a tarefa da reflexão filosófica seria prover fundamentos empíricos para o conhecimento, reduzindo conceitos a dados dos sentidos (o chamado fenomenalismo). A proposição “A cadeira é verde” só teria sentido se fosse possível demonstrar, com base na intuição sensível (visão da “verdidude” da cadeira, por exemplo), que a cadeira é, de fato, verde.

Mito do dado

Os pressupostos iniciais do positivismo lógico foram abalados por três trabalhos seminais: Dois dogmas do empirismo (1951), de Willard V. O. Quine (1908-2000), que invalidou a distinção entre sentenças analíticas e sintéticas, Investigações filosóficas (1956), de Ludwig Wittgenstein (1889-1951), cujo trabalho levou ao abandono do fundacionismo, e, finalmente, Empirismo e filosofia da mente, de Sellars.

O ensaio foi apresentado, inicialmente na forma de palestras, em 1956, nas Conferências Especiais em Filosofia, na Universidade de Londres, sob o título “O Mito do Dado: três conferências sobre empirismo e a filosofia da mente”.

O trabalho ficou conhecido, justamente, pelo “mito do dado”, em que o autor ataca a teoria dos dados dos sentidos, o cerne do fenomenalismo dos teóricos do Círculo de Viena. A teoria afirma ser possível fundamentar o conhecimento empírico nas impressões ou dados dos sentidos dos objetos e, desta maneira, obter saber não-inferencial sobre questões de fato.

Sellars aponta uma inconsistência no fato de se extrair fatos epistêmicos, do tipo “(eu sei que) a cadeira é verde”, de fatos não-epistêmicos – “Eu vejo a cadeira verde”. Há uma diferença em ter a sensação de uma cadeira verde e saber que é uma cadeira verde.

O ponto é que não se pode conhecer sem antes ter adquirido uma competência linguística. Conhecer envolve, diz Sellars, um processo inferencial e uma dimensão social que foi capturada, com competência, pelo conceito de “jogos de linguagem” do “segundo” Wittgenstein.

Além disso, a dificuldade de se saber que “A cadeira é verde” somente ao ter impressões do “verde” está no fato de que conhecer algo envolve uma consciência classificatória – isto é verde, aquilo é não-verde – e subsunção de particulares a classes gerais, como o termo geral “cadeira” que representa todas as cadeiras individuais. Envolve, em suma, conceitos e inferências.

É essa propriedade de se obter um conhecimento não-conceitual que Sellars rejeita e, existindo essa incoerência na teoria dos dados dos sentidos, não há como fundamentar o conhecimento empírico em dados sensoriais, pois o pré-requisito é o domínio de uma linguagem.

Linguagem e consciência

Sellars vai além ao afirmar que a linguagem é não somente prerrogativa de qualquer conhecimento como também da própria consciência. Estar consciente não é simplesmente ter sensações, mas possuir uma habilidade linguística. E, como a linguagem é um fenômeno social, a consciência e o conhecimento se esgarçam num processo coletivo e autoregulatório de aprendizagem.

Uma criança só pode desenvolver uma capacidade cognitiva quando adentrar, por via dos conceitos, o espaço normativo de razões, em que a comunidade de interlocutores se insere. Somente ali poderá justificar e se responsabilizar pelo que diz, pois “[...] dizer que certa experiência é um ver que algo é o caso é fazer mais do que descrever a experiência. É caracterizá-la, por assim dizer, como uma asserção ou afirmação, [...] endossar tal afirmação.”

Não há possibilidade de crença que não seja articulada conceitualmente e nem possibilidade de fundamentação de conhecimento empírico, uma vez que o processo é apenas regulador. Conforme diz Sellars, “[...] o conhecimento empírico, como sua sofisticada extensão, a ciência, é racional, não por ter uma fundação, mas por ser um empreendimento autoregulador que pode colocar qualquer afirmação em questão, embora não todas simultaneamente”.

Tais reflexões refutaram o verificacionismo e atomismo lógico dos positivistas, e também uma determinada ideia de mente compartilhada tanto por tradições empiristas como racionalistas.

São interessantes as confluências entre as propostas de Sellars e o fundador do pragmatismo, Charles Sanders Peirce (1839-1914), que no artigo Questões referentes a certas faculdades reivindicadas pelo homem, de 1868, fez a mesma trajetória e chegou a destino muito parecido. As proximidades entre os autores, já apontadas por Rorty, mostram que filósofos analíticos e pragmatistas talvez sejam mais do que meros vizinhos.


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